Uma das maiores conquistas da humanidade é a representatividade. Ainda que falho, muitas vezes corrupto e sujeito à mediocridade, o sistema representativo é, quando honesto, inquestionável. Afinal, se um governo existe para me representar, e não para me tiranizar, supõe-se que ele tenha que ter sido nomeado por mim – e pelos outros que ele representa – para o cargo, incluindo-se aí tanto os benefícios quanto as responsabilidades do mesmo. Caso contrário, tem que cair. Seja o síndico, o técnico, o mestre ou o presidente. Justo e simples.
Ainda que existam fatores diversos que possibilitem a “manipulação” do processo, existe a lei para regulamentar e julgar os casos em geral e especificamente, através de uma legislação que se pauta pela Constituição que, por sua vez, foi feita pelos tais representantes mencionados.
Além disso, a democracia participativa seria inviável levando-se em conta 6 bilhões de terráqueos e aumentando. A maioria não vai nem na reunião de pais do colégio dos filhos.
Sendo assim, se um povo, ou pelo menos a parte dele que se manifesta e, portanto, se interessa, expressa publica e veementemente que não quer mais ser representando por alguém, ou alguma instituição qualquer – e tem embasamento legal ou moral para tal reivindicação – o mínimo que se espera é que esse alguém caia fora o quanto antes. A menos que ele se ache acima da lei e, portanto, da legalidade representativa.
Quem deve escolher seus governantes são os governados que, por sua vez, devem corresponder, ainda que minimamente, às expectativas.
segunda-feira, 22 de junho de 2009
quarta-feira, 17 de junho de 2009
segunda-feira, 15 de junho de 2009
Teerã
JON LEYNE (BBC)
Com a continuação de manifestações contra os resultados da eleição presidencial no Irã, a situação na capital, Teerã, está se tornando imprevisível e potencialmente explosiva. Durante todo este domingo (13), multidões se concentraram em diversas áreas, em protestos que não haviam sido organizados.
Em congestionamentos, motoristas tocavam a buzina para expressar oposição ao governo. Multidões nas calçadas cantavam e faziam sinais de vitória com as mãos.
Em alguns lugares, a polícia compareceu em grande número. Alguns policiais estavam aparelhados para enfrentar confrontos. Outros apareceram na garupa de motocicletas. Aparentemente, eles receberam instruções claras para não abrir fogo. Embora fosse possível ouvir tiros ocasionais, a maior parte da polícia usava cassetetes de maneira brutal.
É difícil obter um quadro confiável da dimensão dos protestos em Teerã e, mais ainda, no resto do país. Mas eles se propagaram rapidamente durante a noite. O barulho da multidão foi ouvido até mesmo nos bairros de classe média, que costumam ser mais sossegados. Muitos iranianos subiram nos telhados das casas para gritar slogans como "abaixo o ditador".
Os protestos se transformaram em um desafio não apenas ao resultado das eleições, não apenas ao presidente Mahmoud Ahmadinejad, mas também ao líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei. Isso significa um desafio a toda a base da república islâmica. Durante dois anos, pude observar jovens e ambiciosos iranianos tocando suas vidas em meio a uma crescente frustração.
Eles sentem que o sistema sufoca suas aspirações. Agora, eles acreditam que sua inteligência e seu orgulho foram insultados por um resultado eleitoral que muitos iranianos acreditam ter sido fraudado de uma forma grosseira. E a forma quase despreocupada com que o presidente Ahmadinejad rejeitou as reclamações apenas aumentou a raiva dos iranianos.
Sem precedentes
Apesar dos protestos, o presidente Ahmadinejad ainda tem muitos partidários. Muitos deles apareceram no comício de vitória que o presidente fez no centro de Teerã na tarde de domingo. Ele concentrou seu discurso em críticas a governos de outros países e à imprensa internacional, responsabilizando-os pelos problemas na eleição.
Agora existe o risco de que os dois lados das manifestações no Irã se enfrentem. E muitos temem que o governo dê a autorização para que a polícia abra fogo se a situação ficar fora de controle. Mas ainda é difícil avaliar que tipo de concessão política poderá ser feita.
Ahmadinejad continua com sua postura de desafio, confiante no apoio do líder supremo. E a oposição vai descobrir que o recurso (contra o resultado das eleições) tem mínimas chances de ser bem sucedido. É uma situação sem precedentes nos 30 anos de história da república islâmica e é impossível prever seu resultado.
Com a continuação de manifestações contra os resultados da eleição presidencial no Irã, a situação na capital, Teerã, está se tornando imprevisível e potencialmente explosiva. Durante todo este domingo (13), multidões se concentraram em diversas áreas, em protestos que não haviam sido organizados.
Em congestionamentos, motoristas tocavam a buzina para expressar oposição ao governo. Multidões nas calçadas cantavam e faziam sinais de vitória com as mãos.
Em alguns lugares, a polícia compareceu em grande número. Alguns policiais estavam aparelhados para enfrentar confrontos. Outros apareceram na garupa de motocicletas. Aparentemente, eles receberam instruções claras para não abrir fogo. Embora fosse possível ouvir tiros ocasionais, a maior parte da polícia usava cassetetes de maneira brutal.
É difícil obter um quadro confiável da dimensão dos protestos em Teerã e, mais ainda, no resto do país. Mas eles se propagaram rapidamente durante a noite. O barulho da multidão foi ouvido até mesmo nos bairros de classe média, que costumam ser mais sossegados. Muitos iranianos subiram nos telhados das casas para gritar slogans como "abaixo o ditador".
Os protestos se transformaram em um desafio não apenas ao resultado das eleições, não apenas ao presidente Mahmoud Ahmadinejad, mas também ao líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei. Isso significa um desafio a toda a base da república islâmica. Durante dois anos, pude observar jovens e ambiciosos iranianos tocando suas vidas em meio a uma crescente frustração.
Eles sentem que o sistema sufoca suas aspirações. Agora, eles acreditam que sua inteligência e seu orgulho foram insultados por um resultado eleitoral que muitos iranianos acreditam ter sido fraudado de uma forma grosseira. E a forma quase despreocupada com que o presidente Ahmadinejad rejeitou as reclamações apenas aumentou a raiva dos iranianos.
Sem precedentes
Apesar dos protestos, o presidente Ahmadinejad ainda tem muitos partidários. Muitos deles apareceram no comício de vitória que o presidente fez no centro de Teerã na tarde de domingo. Ele concentrou seu discurso em críticas a governos de outros países e à imprensa internacional, responsabilizando-os pelos problemas na eleição.
Agora existe o risco de que os dois lados das manifestações no Irã se enfrentem. E muitos temem que o governo dê a autorização para que a polícia abra fogo se a situação ficar fora de controle. Mas ainda é difícil avaliar que tipo de concessão política poderá ser feita.
Ahmadinejad continua com sua postura de desafio, confiante no apoio do líder supremo. E a oposição vai descobrir que o recurso (contra o resultado das eleições) tem mínimas chances de ser bem sucedido. É uma situação sem precedentes nos 30 anos de história da república islâmica e é impossível prever seu resultado.
terça-feira, 9 de junho de 2009
Auschwitz é bonito? - por João Pereira Coutinho (Folha de São Paulo - 09/06/2009)
A pergunta é inevitável: será que a estética é independente de considerações éticas?
GOSTO DE polêmicas. Elas picam o cérebro como certos toureiros picam o touro. E o touro reage.Portugal decidiu embarcar em aventura conhecida: eleger Sete Maravilhas que os portugueses, povo de marinheiros, espalharam pelo mundo. Existe uma lista inicial com 27 monumentos. O Brasil, recordista total, está representado com o Convento de Santo Antônio e Ordem Terceira, no Recife; com o Mosteiro de São Bento, no Rio; com o Convento de São Francisco, na Bahia; com o Mosteiro de São Bento, em Olinda; com a Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto; com o Forte do Príncipe da Beira, na atual Rondônia; e com o Santuário do Bom Jesus, em Congonhas.Subitamente, a indignação explodiu: historiadores de todo o mundo acusaram a organização do concurso de ocultar a terrível verdade. Para os indignados, alguns dos monumentos estão marcados pela vergonha da escravatura. É o caso da Fortaleza de São Jorge da Mina, em África, entreposto preferencial do tráfico. Os historiadores querem respeito pela história e exigem referência ao passado vergonhoso de Portugal. Que dizer? Duas coisas. A primeira, óbvia, é que a intenção dos historiadores não é simplesmente científica. Ela insere-se na vetusta tradição contemporânea de pedir desculpas pelos crimes dos antepassados, como se a culpa fosse uma espécie de vírus que passa de geração em geração. Será? Em caso afirmativo, não há nenhum motivo para pararmos nos portugueses. Pior: não há nenhum motivo para pararmos na Europa. Se a Europa colonizou África, outros povos colonizaram a Europa anteriormente. A história da civilização é, como diria Churchill, a história das suas guerras: da forma sucessiva como sucessivas civilizações foram conquistando e explorando as outras. Falar dos crimes do passado é falar de todos os crimes. E quem, honestamente, fica inocente nesse revisionismo total? Se a ideia dos historiadores é expiar as culpas passadas, melhor seria que denunciassem os crimes presentes: em África, na Ásia, mesmo na América Latina. Como conta E. Benjamin Skinner, em obra obrigatória sobre a matéria ("A Crime So Monstrous"), existem hoje mais escravos do que em qualquer outro período da história humana. Skinner não fala do simples tráfico de mulheres, a única forma de "escravatura" que parece incomodar as consciências progressistas.Skinner fala da servidão que existe em África, onde homens, mulheres e crianças são capturados em cenários de guerra e obrigados a trabalhar em campos ou pedreiras. Fala dos 10 milhões de escravos na Índia, obrigados a trabalho duro para pagar "dívidas transgeracionais". Pedir desculpas pelos crimes dos antepassados é um exercício inútil e, além disso, perfeitamente analfabeto. Mas se os historiadores que protestam cometem o erro anacrônico de julgar o passado com as categorias do presente, a verdade é que também não concordo com os organizadores do concurso que defendem as "maravilhas" com critérios exclusivamente estéticos. A pergunta é inevitável: será que a estética é independente de qualquer consideração ética? Ou, dito ainda de outra forma, será possível apreciar determinadas obras artísticas sem perder tempo com a dimensão imoral que paira sobre elas? Pessoalmente, sempre tive dúvidas. Acredito que Leni Riefenstahl seja um caso de talento no documentarismo germânico do século 20. Filmes como "O Triunfo da Vontade" ou "Olympia", no seu rigor iconográfico e na exaltação da força e da ordem, podem ser esteticamente impressionantes. Mas será possível apreciar Riefenstahl pelas qualidades puramente estéticas dos seus filmes? Será possível iludir, ou esquecer, que a "exaltação da força e da ordem" servia uma causa particular? Uma causa criminosa particular? Não creio. Fechar a discussão estética nas qualidades puramente formais de uma obra implicaria posições moralmente insustentáveis. Implicaria que, no limite, fosse possível elogiar a belíssima arquitetura das câmaras de gás de Auschwitz sem atender aos milhões de seres humanos que foram assassinados debaixo de tanta "beleza". Na polêmica das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo, ambos os lados chafurdam no erro e na hipocrisia. Nenhum país deve pedir desculpas pela sua história. Mas nenhum país deve reduzir a sua história a uma simpática galeria de adornos. Os fantasmas não nos perdoariam. jpcoutinho@folha.com.br
GOSTO DE polêmicas. Elas picam o cérebro como certos toureiros picam o touro. E o touro reage.Portugal decidiu embarcar em aventura conhecida: eleger Sete Maravilhas que os portugueses, povo de marinheiros, espalharam pelo mundo. Existe uma lista inicial com 27 monumentos. O Brasil, recordista total, está representado com o Convento de Santo Antônio e Ordem Terceira, no Recife; com o Mosteiro de São Bento, no Rio; com o Convento de São Francisco, na Bahia; com o Mosteiro de São Bento, em Olinda; com a Igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto; com o Forte do Príncipe da Beira, na atual Rondônia; e com o Santuário do Bom Jesus, em Congonhas.Subitamente, a indignação explodiu: historiadores de todo o mundo acusaram a organização do concurso de ocultar a terrível verdade. Para os indignados, alguns dos monumentos estão marcados pela vergonha da escravatura. É o caso da Fortaleza de São Jorge da Mina, em África, entreposto preferencial do tráfico. Os historiadores querem respeito pela história e exigem referência ao passado vergonhoso de Portugal. Que dizer? Duas coisas. A primeira, óbvia, é que a intenção dos historiadores não é simplesmente científica. Ela insere-se na vetusta tradição contemporânea de pedir desculpas pelos crimes dos antepassados, como se a culpa fosse uma espécie de vírus que passa de geração em geração. Será? Em caso afirmativo, não há nenhum motivo para pararmos nos portugueses. Pior: não há nenhum motivo para pararmos na Europa. Se a Europa colonizou África, outros povos colonizaram a Europa anteriormente. A história da civilização é, como diria Churchill, a história das suas guerras: da forma sucessiva como sucessivas civilizações foram conquistando e explorando as outras. Falar dos crimes do passado é falar de todos os crimes. E quem, honestamente, fica inocente nesse revisionismo total? Se a ideia dos historiadores é expiar as culpas passadas, melhor seria que denunciassem os crimes presentes: em África, na Ásia, mesmo na América Latina. Como conta E. Benjamin Skinner, em obra obrigatória sobre a matéria ("A Crime So Monstrous"), existem hoje mais escravos do que em qualquer outro período da história humana. Skinner não fala do simples tráfico de mulheres, a única forma de "escravatura" que parece incomodar as consciências progressistas.Skinner fala da servidão que existe em África, onde homens, mulheres e crianças são capturados em cenários de guerra e obrigados a trabalhar em campos ou pedreiras. Fala dos 10 milhões de escravos na Índia, obrigados a trabalho duro para pagar "dívidas transgeracionais". Pedir desculpas pelos crimes dos antepassados é um exercício inútil e, além disso, perfeitamente analfabeto. Mas se os historiadores que protestam cometem o erro anacrônico de julgar o passado com as categorias do presente, a verdade é que também não concordo com os organizadores do concurso que defendem as "maravilhas" com critérios exclusivamente estéticos. A pergunta é inevitável: será que a estética é independente de qualquer consideração ética? Ou, dito ainda de outra forma, será possível apreciar determinadas obras artísticas sem perder tempo com a dimensão imoral que paira sobre elas? Pessoalmente, sempre tive dúvidas. Acredito que Leni Riefenstahl seja um caso de talento no documentarismo germânico do século 20. Filmes como "O Triunfo da Vontade" ou "Olympia", no seu rigor iconográfico e na exaltação da força e da ordem, podem ser esteticamente impressionantes. Mas será possível apreciar Riefenstahl pelas qualidades puramente estéticas dos seus filmes? Será possível iludir, ou esquecer, que a "exaltação da força e da ordem" servia uma causa particular? Uma causa criminosa particular? Não creio. Fechar a discussão estética nas qualidades puramente formais de uma obra implicaria posições moralmente insustentáveis. Implicaria que, no limite, fosse possível elogiar a belíssima arquitetura das câmaras de gás de Auschwitz sem atender aos milhões de seres humanos que foram assassinados debaixo de tanta "beleza". Na polêmica das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo, ambos os lados chafurdam no erro e na hipocrisia. Nenhum país deve pedir desculpas pela sua história. Mas nenhum país deve reduzir a sua história a uma simpática galeria de adornos. Os fantasmas não nos perdoariam. jpcoutinho@folha.com.br
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